domingo, 16 de novembro de 2008

Como dois e dois são cinco

(Marquinhos, novembro de 2007, em Paris)

(Julia, hoje à tarde, com 2 meses e 20 dias, em São Paulo)

Uma coisa estranha move em mim sempre que me perguntam “como estou”. E me perguntam muito, e com sinceridade, graças a Deus. Invariavelmente, antes de responder, me paraliso um segundo. Sinto, mesmo que rapidamente, um misto de tristeza, medo e, vejam só, vergonha. É tão estranho que até vinha me irritando um pouco. Por que diabos me envergonha dizer que estou bem, apesar dos pesares? Que tipo de decoro é esse, tão sem sentido, que me faz ter medo do ridículo?

Hoje, pensando um pouco no sofá depois que a Julia dormiu, me dei conta. Entendi que minha noção de estar bem mudou tanto, mas tanto, que temo não ser compreendida. Em poucas palavras, acho que hoje eu me contento com menos para estar bem. Não dá para ser diferente, já que o maior desejo da minha vida é absolutamente impossível. Sabe quando seus pais perguntavam, na infância, que presente você queria para o Natal e você tinha certeza que o mais desejado (para mim um carro ou, pelo menos, uma moto) nunca você ganharia? É assim que me sinto. E, sendo assim, não me resta mais que aparar as arestas do desejo, e desejar menos, sempre menos para ser feliz.
É um exercício, viu. Claro, não dá para esquecer que eu tenho a Julia, meu eixo, meu ponto no círculo, que sorri quando me enxerga se aproximar do berço, às seis da matina. Estou completamente apaixonada pela minha filha, "um amor tão grande que dói" – exatamente como eu repetia ao Marquinhos. Ela me faz feliz, e também me faz refletir.
Não gosto de pensar que nosso amor era como um grão, e precisou morrer para germinar. Não gosto de imaginar que os céus só me deram o direito a uma enorme felicidade por vez: primeiro o homem da minha vida, e só depois a minha filha. E para não cair nesse labirinto mental, eu faço um trabalho absolutamente racional de levar o pensamento para outro extremo. Foi o próprio Marquinhos quem me ensinou a agir assim, radicalmente objetiva. “Acordou com vontade de ficar o dia na cama, coberta, escondida, pois então levante, vista sua melhor roupa e saia de casa. E se, ao contrário, acordar com euforia sem tamanho, capaz de sair cantando, fique um tantinho mais na cama, quieta, até se equilibrar”, dizia ele. Uso essa técnica.

E aí, quando encontro alguém que me pergunta como estou, penso assim: como estou considerando esse lado aqui da mente, ou segundo esse outro lado?
Tudo isso para dizer que ouvi uma música velha, acho que de Caetano Veloso, gravada por Roberto Carlos de 1971 (quando nem eu, nem o Marquinhos tínhamos nascido), que resume como estou hoje, vésperas do dia 18 de novembro, sete meses depois. Diz assim: “Meu amor! Tudo em volta está deserto, tudo certo. Tudo certo como dois e dois são cinco.” Ou, para quem é capaz de entender, estou triste, mas estou feliz.

9 comentários:

Unknown disse...

Essa matemática da vida é difícil, mas acho que você está conseguindo dar uma bela aula. Tenho um orgulho imenso de você. Bjos!

Anônimo disse...

Os paradoxos do sentir, Martinha. Triste e feliz ao mesmo tempo, e seguindo em frente -- o mais importante. Beijo pra vcs duas, Ju

Anônimo disse...

Amiga querida, vc está completa. Penso em vocês todos os dias. Ah, sim, e a Julia é a cara do Gusma, impressionante! bjs bjs bjs

Anônimo disse...

ah, mais uma coisa... não aguentei e coloquei a foto da Julia no blog (sutiadeferro.blogspot.com). É que ela tá demais de lindaaaa!!!! bjs!!!

Unknown disse...

Martinha, os seus textos me fazem acreditar mais ainda que estamos aqui para encher o mundo de alegria, ser felizes e fazer bem ao outros.
O seu blog me faz muito bem. Eu leio seus posts e fico refletindo, refletindo, e sempre saio de onde estou com vontade de ser uma pessoa melhor e deixar a vida das pessoas que eu amo mais colorida. E, pq não, das pessoas que eu mal conheço também...
Você é muito especial. Tenho muito carinho por você e pela Julia, que está cada dia mais linda.
Um beijo enorme para vocês duas.
Amanda

Marta disse...

Nossa, Amanda, nunca imaginei... Que bom ler isso, menina!
Uau. Agora entendi um monte de coisa, obrigada.
E puxa Anne, você era a única pessoa que ainda dizia que a Julia parecia comigo! :(

Ninha disse...

Martinha, Gusmão é presente todos os dias na redação. Vira e mexe alguém tá lembrando ou dizendo ou falando sobre ele. Que bom que você tá bem. Já te falei que quando crescer vou querer ser igual você!

Anônimo disse...

Amei e amo tudo que você escreve, Martinha. É o máximo. Quando leio seus textos, passo o dia lendo e relendo em minha mente, e tentando imaginar cada situação, cada movimento. Não é fácil, mas você é poderosa, mulher!! bjs

Anônimo disse...

Martinhaaaa,
Amei seu texto e amei seu blog!!!
E eu que penso sempre em você, que quero saber como você está e como está a Julia e nunca tenho coragem de perguntar, para não te fazer lembrar. rá.como se pudesse esquecer! Que bom achar o seu blog!aqui tive acesso a tudo! A fotos da fofa(linda de morrer, a seus momentos e sentimentos, lindamente escritos!!!
Arrasou!
Muitos beijos
Deni